terça-feira, 28 de maio de 2013

Misantrópico

     Essa solidão... 
     Caminhava como um profeta em uma estação de trem, lá estava um relógio bem em cima de mim e um bebê chorando dentro de uma lata de lixo; foi aí que acabei vendo uma fotografia, dos anos 40-50, de uma tenda com diversas capas de "livros banidos e obscenos". Howl estava lá... agora é tão fácil ter esse texto em mãos, mas garanto que vende menos do que naquela época de repressão. O paraíso é aqui, foi aqui.

     Mais vale encarar o absurdo do que me iludir com verdades, Schopenhauer já dizia sobre a irracionalidade da vida: onde não há necessidade.... há tédio, e por certo de uma vontade que nunca é suprimida, porque é a vontade que move o mundo. A vontade de uma planta crescer, a vontade de um ser nascer. Tudo parte dessa vontade irracional de ter vontade, daí a nunca realização, daí o sofrimento de não se realizar.

     Era incerta a tempestade naquele abafado final de tarde. As ruas se enchiam de carro e pedestres agindo como formigas correndo para o formigueiro. Tinha passado meu entardecer numa pracinha sentado sobre a grama ouvindo um ser proclamando seus poemas e dizendo coisas profanas, fiquei em silêncio.
     "CAROS CONTEMPORÂNEOS, venho proferir a palavra da suprema Senhora in vitro, santa seja, santa, santa!
Há nesse século INÚMEROS revolucionários sem ESPÍRITOS e sem rostos, Abraxas devia nascer na juvenilidade, mas não há quem chocar seu ovo, ninguém que acolha seus sentimentos, viramos abutres, vagando sobre a terra avermelhada ansiando por carne. ANUNCIAM-SE ,então, as tempestades com suas nuvens acinzentadas e seu vento resfriando os pulmões cheios de muco do tabaco e do catarro. Amamos os outros como amamos a nós mesmos, e transferimos nossos problemas neles, porque o outro serve como um espelho em um mundo cheio de sombras, vagando sem se envolverem. Senhores, não sei se por conforto ou por ingênua auto-análise que pessoas rompem a integridade entre suas palavras e suas ações. A vida ativa se tornou tediosa, enquanto a vegetativa: uma necessidade. Vejo anarquistas repugnando o Estado, mas pouco sabem sobre auto-disciplina, e relacionando seu grande "A" à confusão e destruição não passam de adolescentes mal resolvidos. Mas infelizmente é o próprio estado, a mãe desses anarquistas de pichação, pois ela não cria autonomia, ela quer que lhe sirvam de PARASITAS e que cada um tema seu próximo. Pois o homem que substitui a teologia, dizendo que ela é o ópio do povo, por uma ideologia qualquer, se ilude. Quem não mostra a cara, tem medo de ser ferido, quem se esconde EM IDEOLOGIAS, suspende a auto-crítica.  PORTANTO, queimais a "veja" no inferno, porque ela é como um esgoto, sua capa um bueiro, transmitindo a peste para todos que tentam sair pelas ruas.  E NÃO TROCAIS O SIGNIFICADO da bebida, pois muitos estão usando-a como fonte, para suportar os outros ao seu redor. Ouça sua criança, e não faça apenas o que tua mente pede, faça aquilo que tu entendes como certo. DO BEM, DO MAL E DO TITÂNICO serei a tudo um todo."
      Tive que ir para casa, já passavam das vinte horas, e aquele pagão continuava recitando as mesmas palavras sem parar, não suportei, estava com fome e decidi comer um omelete.

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Morar aqui

     Tudo que pude imaginar foram luzes, quatro cores especificamente sobrepondo um fundo negro no meu mundo de sempre, imaginando coisas como em um sonho alucinógeno. Sempre pensava muito, muitas coisas sobre variados assuntos, de gastronomia à práticas pedagógicas, mas nunca quis colocar isso no papel... estava esperando chegar a uma maturidade para o fazer, mas acho que sempre adiantarei essas coisas, nunca me sentirei preparado para tal. 
     Uma moça vestida de modo "alternê" sobrepôs seu casaco sobre meu peito, nesse momento saí daquelas cores e encarei um mundo mais amarelo, um pouco mais cru e vazio, feito por esses postes de iluminação. Ela olhou para meus olhos com uma preocupação que só via nos olhos da minha mãezinha
-Está frio esta noite, oque faz um homem arrumado como você deitado neste ponto de ônibus?
     Encarei seus olhos e soltei um leve sorriso retribuindo seu favor, mas não quis responder sua dúvida, estava feliz com meu pensamento naquelas luzes... naquela brisa, simplesmente, não havia necessidade nenhuma de explicação. Mas senti sua angústia
-Estou aqui simplesmente... quer dizer, estava
-Como assim?
-Estava no meu mundinho, vivendo meus delírios e você?
-Estava dando uma caminhada antes de ir pra casa, não tenho muito compromisso com meu sono, acabo acordando bem, mesmo dormindo pouco...
-É que você sonha demais, como eu
-Desculpe, se fui muito brusca em começar uma conversa contigo, é que eu sempre tive essa vontade de conhecer alguém e começar um papo estranho com alguém estranho e depois obter alguma iluminação que me faça entender melhor essa tal "vidinha triste"
-Sei bem oque tu pensas, na verdade acho que tenho pouco carvão em minhas palavras pra poder queimar algo na tua cabeça
-Como você veio parar aqui então...?
-Foi uma curta história... mas o importante é como poderia continuar; talvez... Mas digo que o primeiro dia na rua é o pior, porque tu ainda tem esperança de que tudo volte ao normal, que alguém te acolha e te leve para casa, que te ofereça uma oportunidade e você acabe saindo nos jornais como exemplo de superação de vida, mas você acaba, com o tempo, esquecendo disso, não que você deixe de sonhar, mas seus sonhos são transferidos para outras coisas, quer dizer, para outros meios, principalmente para pensamentos como: "irei acordar com a vida intacta amanhã?" Até descobrir que não há volta, você descobre novas formas de experimentar a tristeza, e tua vida começa a se tornar uma mistura de tédio e necessidade, só quando se resgata os sonhos, os delírios, as utopias é que a vida volta a ser mais leve... Isso não fui eu quem experimentei, apenas tive uma conversa com um senhor de meia idade, que foi encontrado morto na praça do "peladão" esses tempos atrás, infelizmente não é a minha história, por isso desculpe moça, sou apenas um universitário descansando seus desejos reprimidos em um lugar qualquer, mas se posso lhe dizer uma coisa, é a seguinte " Eu pensava que sonhar era fugir da realidade, mas vejo hoje que sonhar faz parte dela" 

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Feliz formalidade

Há quem seja feliz nessa vida?
Talvez aquele que saiba conviver com a tristeza
Ou mesmo aquele que aguenta o silêncio dos outros
quem sabe muito daqueles que se contentam em dividir mágoas consigo mesmo

Aqueles que nunca tocaram o absurdo
A menina que não se frustra com possibilidades, escolhas, mas vive...
vive pelo determinismo social do horóscopo
e o garoto do bar que é revolucionário, mas...
usa máscaras

Aqueles que leem romances de virtudes duvidosas
Ou aqueles que não perdem a intensidade majestosa do calor, do amor ou do sabor
Aqueles que amam e sempre amaram, e que já perderam, mas nunca ganharam
Ou muitos que imortalizam os outros para serem imortalizados

Aqueles que sofrem, mas sonham
Aqueles que sonham, mas dividem...
seus delírios
Uns que são ouvidos pelo psiquiatra e outros...
 que apenas uivam para seu cachorro

O moço rígido, frio, curto e breve
A senhorita minimalista, reclusa e frágil
Aqueles que escrevem e tentam expressar tudo aquilo que não possuem
As pessoas que espelham seus problemas nos outros
Os velhos que vivem em frente da tv, contemplando a máquina
talvez, mas talvez, os negociadores de prazeres, as quimeras miseráveis das orgias
Aquelas que em náusea se refugiam no som do jazz

Se eu opto pelo bem ou pelo mal?
Para mim toda ideia é "amoral", não "imoral"
Se fosse eterno... não saberia 

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Caro Alfred Fessard,

        Procurei teu nome em enciclopédias e em listas telefônicas... em sites, em bibliotecas, só achei um texto em francês de uma moça sobre você. Dizia ela, por intermédio de meu dicionário bilíngue, que tu tivera contatos com os maiores e mais belos intelectuais de sua geração, Darwin, Wundt, James... e até mesmo com aquele eugênico do Galton; Pois bem, não consegui muito bem entender a sua teoria sobre a consciência em seres ilusórios, teria os meus seres inconscientes um mínimo de consciencia? Não sou capaz de ter consciência sobre minha totalidade, mas os seres, as pessoas que gero em minha mente possuem esse dom? Ou seja, sou puraS matériaS ambivalenteS conflitanto ou somos em minha mente um nós e não um ego cartesiano? Infelizmente soube, por intermédio da moça francesa, que você morrera de solidão e embriaguez... bem típico senhor Zard! Mas se ainda tiver um tempo para transitar do mundo dos mortos para este paraíso, prometa que trará mais teorias! Aliás, traga mais perguntas pra cá, prometa! Sei que na sua época os homens eram perseguidos por perguntas, mas os tempos mudaram, agora somos perseguidos e abusados por respostas! Bombardeados por informações, e por incrível que pareça, mesmo morta, Clarice Linspector continua compondo novas frases para o seu público, por isso tenho esperanças que um dia você também continua produzindo algum conhecimento... mesmo morto poderíamos passar horas discutindo alguma coisa que não seja religião, homosexualidade ou corrução, talvez, mesmo que eu não esteja mais acostumado, talvez... Mas me diga, você é brasileiro, certo? E o único fragmento sobre sua vida está em francês, como isso aconteceu? Além disso, por que não publicou nenhum livro? Pretende ainda mandar seus textos para serem organizados em uma editora, com uma capa misteriosa e um título bacana, para ficar exposto no miúdes de uma livraria competindo com livros de obviedades? Bem, desejo que você tenha bons momentos aí em baixo com os demônios de sua razão, não se esqueça de traçar pactos com esses tais filósofos existencialistas, te dará um pouco de esperança... talvez!

Um grande aperto de mão, e uma boa não vida!
                                   De um desconhecido, leitor de obras sobre autores